Igual mais diferente
(= + ≠)
“Às vezes digo a mim mesmo que profanamos a vida:
de tanto ver as coisas, não as enxergamos mais”
Matisse.
A obsessão pelo fazer é a tônica
da produção artística de Áurea Madeira. Ela optou pelo excesso, pelo múltiplo,
pelo acúmulo. É na concentração que inscreve seu pensamento, na lotação que
transmite suas ideias, no transbordamento que encontra prazer para produzir.
Não à toa elegeu como guia a Teoria da Formatividade elaborada por Luigi
Pareyson, a qual propõe uma compreensão da obra de arte através do formar/fazer.
Foi assim, tendo como diretriz a ação formativa, que esta exposição se
construiu. Cada peça criada exigia outra e mais outra e mais outra. Cada pedaço
pronto indicava o caminho para a elaboração dos demais. Nada está pronto, nem
dado. Tudo é transformado durante sua própria feitura. Nenhuma ideia é sólida o
suficiente para ser perene. Compreender isto tornou possível depreender o seu
trabalho e o seu processo criativo.
É por meio do exercício contínuo
em perceber a si mesma, o mundo, o outro e sua relação com este e naquele, que Áurea
Madeira não profana a vida; ao contrário, transpõe as barreiras da visibilidade
material e vislumbra a possibilidade em ressignificar seu próprio eu através de
seus pedaços. Sim, são dois pedaços – vistos e sentidos diariamente – de seu
corpo que conformam e informam o caminho da criação. Ao eleger seus joelhos
como foco, ela rompe com a necessidade de representação do corpo para operar
com a noção de corporalidade. Não existe um corpo e sim um corpus que inscreve novos modos de enxergar as coisas. É com a
apropriação de si, pela captura da forma de seus joelhos, que Áurea anuncia um
discurso sobre a igualdade e a diferença. Apesar de serem joelhos, ou seja,
nominalmente idênticos, são formalmente heterogêneos e a soma de suas
características está aqui apresentada. Que joelhos?
Fábio Gatti
Artista visual
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